quarta-feira, 12 de outubro de 2011

A Canção Mais Bela

Eu queria compor uma canção.
Uma canção bela, bela, tão bela
que mais bela fosse que minha vida.
Queria aproximá-la do mar e do ar e do amar.

Por onde onda? Onde está a canção mais bela?
Talvez pendendo caule, folhas e flor da primavera.
Reinventa-se perdida no verão que vem quente demais?
Será que ela vive nas árvores nuas e folhas caídas do outono?
Ou quem sabe se escondeu no inverno sulista de nosso país?

A canção mais bela foi quebrar as folhas nas músicas dos pés.
E o inverno quente dos edredons aquece meu corpo ardente.
Veio a mim todo o outono e me pus a pensar, a querer e a doer.
Assim a mistura das estações faz trança de flores em meus pés.
Tudo de tudo de mim, inclusive você, meu amor eminente.

A canção mais bela, que brinca de reinar em meu castelo,
liga-se pelos tempos que não se ligam e não se desprendem.
Porque todo o tempo se faz um na semente de quatro pés.
E vem a mim e se faz só um e brinca e canta minha canção mais bela
pra você que pode, enfim, morar dentro dela como o ar e o mar.

domingo, 9 de outubro de 2011

Dia Branco

Eu ando pelas ruas.
Quero caminhar em busca de cores.
Que me importa o verde, o branco, o vermelho, o azul ou o amarelo!
Pode ser lilás, fugidio, apagado ou violeta até!
Quero pigmentos coloridos.

Mas ando, ando e ando e só há igual.
As ruas estão todas vazias.
Não há razão.
Tudo desconta passado.
Volto para casa também sem móveis e chão.

Se dormi a noite não avermelhou
Se sonhei o tempo não me acordou
A vigília é a namorada que não vi
Móveis imóveis, paredes desbotadas
Escreva meu tempo de revés de ontem

Paredes de ruas vacilantes
Quem morou ali, o que cria, o que fazia?
Escondidas noites enluaradas
De brancas, tão brancas me ceguei
Caí e no chão da história tropecei
Alucinam-me vãos, buracos e diferenças

Há na escuridão do branco da igualdade
A janela aberta das ruas que caminham pelas histórias
Há pedaços de mim nas rugas do velho
Há pedaços de mim no brilhante-diamante
Há pedaços de mim no horizonte-cerrado

Quantas cores? Quantas cores? Quantas cores?
O mundo abriu de vez as janelas?
Me enlouqueci de belezas?
Tudo é cor?
Ou sou eu que nasço muitos anos antes de mim?

sábado, 8 de outubro de 2011

Dois Irmãos: Bethânia e Caetano

Vai cordão da voz e diga lá o que eu não posso dizer aqui.
Meu peito arde por tanto querer expressar-se:
folhinha verde em galho, rosinha no caule abanando...
Já queria desde criancinha, cercar-me em dias e dias de árvores solitárias.
Eu as descobria ao longe sobre a relva verde e clara de doer os olhos.
Quando pequeninha li poesias na escola.
Pensei: peraltices: pique até a data de 31 de janeiro, anel de mão em mão, uva e maçã...


Onde fica a poesia? Sonhava com poemas escritos em nuvens. Lagos rodeando versos.
Uns aqui, outros namorados ali gostavam de meus versos, riam, saudavam.
E o coração em fogueiras alastrava mundo afora.
Os anos viviam em mim como textos insondáveis, inertes de fingimento tantos.
Poemas de rua, como meninos órfãos. Nasciam em bares, em esqüinas e em botequins. Hoje eu, às vezes, escrevo pestanejando, perguntando-me qual a morada da alma?.
Mas, venho bordando palavras de rendas limpas e manchadas.

Às vezes não sei por que escrevo.
Mas, adoraria que muitos me lessem.
Que o recanto das letras saltasse muros.
Eu, pequenina que sou, sonho com dois irmãos:
Bethânia e Caetano cantando minhas músicas. “Pena Miudinha” com eles? “Inquietações” em suas vozes?
Será que seriam tão belas como essa música linda que ouço agora:
“Tempo, tempo, tempo vou lhe fazer um pedido”:
Dêem minhas criações aos Leãozinhos das vozes melodiosas.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Vento-Despedida

-Vento, por que passas tão ligeiro?
-Porque vou levar notícias.
-Levar notícias aonde?
-Ao fim da vida.
-Não, não vás a este lugar.
-Só indo, cumprirei com meu destino de ar.
-Mas, por que o ar passa?
-Porque tudo há sempre de passar.
Até o sol passará.
-Daqui há milhões de anos.
-Sossegue. Dobre seus olhos e eu lhe roubarei a visão.
- Nem sequer minhas pupilas se mexem. Hei de respirar.
-Preciso partir. Sou o tempo que passa.
-Vento, neste adeus, pague-me flores da primavera enquanto elas existem e
vele-me na dor do adeus.
-Não se assuste, em tua partida respondo ao teu adeus.
-Nenhuma despedida é tão certa e difícil ao mesmo tempo.
-Não chores, assim molharás meu véu e sou irmão da morte amiga.
-Sim, Meu Ar, entregue-me meu trigo bom para levar a Deus o que colhi .
-Não se preocupe tu chegarás com os lírios do campo.
-Abane-me, abane-me. Revele-se em toda beleza e grandeza,
Já que o meu tempo chega e tu és o meu par.
Oh vento de todos os ventos.
-Não fales mais, tudo agora se transforma em aurora.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

O Moço Que Chamam Louco

O moço caminha e vai só, muito só, de um jeito seu.
Todos os dias ele caminha todo o tempo...
Subindo e descendo ele caminha e caminha...
Este é seu afazer, dever de casa, tudo que há.

Não faz mal a ninguém. Não diz nada.
Só caminha e às vezes olha.
Quando enxerga um olhar.
Quem o vê, vê a esperança.
Quer ser entendido no olhar.

Moço pobre e rico moço.
Tem tudo: a boca para falar,
os olhos para sorrir, afirmar, negar
E acima de tudo caminha.
Vai pela mão e contramão.

Quem dera que um passante pudesse lhe dar qualquer coisa:
Um abraço, uma palavra, uma compreensão.
De vez em quando em sua pressa em caminhar
para chegar a lugar algum, ele para.
E com seu rosto castigado... fala oi.
Depois corre dando pulinhos saltitantes.

Ele é louco. Muitos têm medo dele.
Mas, o coitado que na vida só caminha acima e abaixo
Só quer sentir saudade da mãe que se foi e correr da solidão da inércia.
Vamos! Não tenham medo. Isso é loucura?
Dêem um sorriso e um perto de mão, ao menos, isso.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Enquanto Há Tempo, Meu Amor

Todas as horas. Passam todas as horas.
Se conto segundos e minutos, não importa.
As horas passam sem piedade.
Domingo passado já não repica mais o sino da missa,.
no próximo domingo é um novo repicar.
Tudo parece igual, mas não é. Tudo é novidade.
O aniversário de uma amiga que no ano passado foi na quinta,
hoje completará o ano seguinte de sua vida na sexta.
No natal, quando todos se abraçam e desejam paz uns aos outros,
noto na face de minha mãe uma cavada ruga a mais;
noto em meu pai os cabelos brancos que lhe tomam toda a cabeça.
O tempo é cruel. Ele não para na encruzilhada, nem ao menos na reta.
O tempo do tempo segue estrada afora e marca toda a diferença. Sempre,
tudo, tudo parece igual. Todo dia é dia. Toda noite é noite.
E vamos ora brincando, ora levando a sério.
Mas sempre na vida e pela vida, por anos a fio.
E você me beijou ontem numa esquina. Este beijo morre comigo também.
Tudo que é belo ou feio vai passar para além da fronteira.
Mas ouça mais uma vez: eu amo você.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Banco à Minha Porta

Quando eu me sento no banco que fica na porta de minha casa,
vou reparando pessoas que passam tristes;
pessoas que passam alegres;
aqueles que andam devagar, pensativos;
outros que seguem correndo, um passo sempre a mais.
Não sei como me identifico com eles, mas me identifico.
Em todos passantes eu sigo meu reflexo.
Com os tristes eu sinto como dói meu coração por tudo que há.
Com os alegres eu descubro minha esperança em tudo que há.
Com os pensativos e lentos, eu questiono os desencontros em muita coisa que há.
Com os que seguem correndo eu percebo minha parte ansiosa que em instantes há.
Acontece que meu sentimento é um sentimento do mundo.
Eu sozinha sinto: tristeza, alegria, lentidão, indagações, ansiedade... o universo.
Mas, eu só estou pensando o que me vai ao peito, à mente.
Tudo é junto: idéia e coração.
Quem se salva primeiro? Nenhum. Idéia e coração são muito juntos, misturados.
A diferença é como eu pego o mundo pelas mãos e o miro.
O que tudo muda é: como meu olhar está sobre tudo que há e como eu vou manifestá-lo.
Estou sentada no banco à minha porta, sou como todos, todos como eu.
Mas que diferença o que vibra no olho de todos que passam.
Será que podemos chamar a isso de alma?